Danilo Carvalho Villela
Cz 4.300
Jesus apresentou diversas parábolas sobre o reino de Deus ou reino dos céus, as quais sempre começam informando que se trata de uma analogia: "O reino dos céus é semelhante..." ou "O reino de Deus é como...". O Mestre não pretendeu descrever aquele reino pois sabia que isso não era possível, de vez que ele significa um estado de integração com as leis divinas em que desaparecem o egoísmo, o apego, o medo e, compreensivelmente, só é conhecido por aqueles que o vivenciam.
Como será viver sem egoísmo? ou sem apego? Conquanto possamos observar o comportamento das pessoas – muito raras entre nós – que atingiram essa condição, não podemos "sentir" o que sentem ao agirem assim, tratando-se, realmente, de experiência incomunicável a quem ainda não a tenha vivido, situação, aliás, da imensa maioria dos espíritos que constituem a população de nosso planeta.
Sem descrever o que sentiam os cidadãos do reino dos céus, apresentou o Mestre algumas características do seu comportamento e, sobretudo, o roteiro para que também atingíssemos, um dia, aquela situação.
A parábola dos trabalhadores da última hora, que comentaremos brevemente a seguir, é algo extensa, pelo que procuraremos resumi-la.
1) O dono de uma vinha sai de sua casa, ainda de madrugada, para contratar trabalhadores para a mesma, dirigindo-se, para tanto, à praça da cidade onde, conforme a praxe oriental de então, se reuniam os que aspiravam a um trabalho. O proprietário combina com eles pagar-lhes um denário1 pelo dia de trabalho.
2) Aquele viticultor vai de novo à praça um pouco antes das 9,12, 15 e 17 horas e, a cada vez, encontra novos candidatos ao serviço, aos quais também contrata, prometendo-lhes pagar o que fosse justo.
3) Finda, às 18 horas, a jornada diária, ele chama o administrador e manda que seja efetuado o pagamento dos trabalhadores, começando pelos últimos a chegar (que só trabalharam das 17 às 18 horas) e indo até aos primeiros, que realizaram uma jornada de 12 horas. O administrador, obedecendo por certo as instruções do senhor, dá a todos o mesmo pagamento prometido aos que haviam chegado primeiro, isto é, um denário.
4) Ao iniciar-se o pagamento, os trabalhadores da primeira hora, vendo os que haviam chegado por último – e que só trabalharam uma hora – receber um denário cada um, pensaram que iriam receber mais, recebendo, no entanto, também um denário. Ficaram, então, insatisfeitos, reclamando dessa injustiça com o dono da vinha e sendo advertidos por este, que lhes indagou se não lhe era lícito fazer o que quisesse com o seu dinheiro, perguntando, ainda, a um deles: "tens mau olho porque eu sou bom?"
Analisando a lição devemos notar que ela não fala de pessoas "da vinha", isto é, familiares ou empregados permanentes daquele senhor, mas sim dos que, não pertencendo a esta, são convidados a se aproximar, realizando algum tipo de trabalho, ou seja, a parábola trata justamente da nossa situação, pois não somos ainda "cidadãos do reino dos céus", mas convidados a nos aproximar dele através da prática do bem (o trabalho na vinha).
Jesus utiliza essa narrativa para nos oferecer mais alguns ensinamentos que destacamos a seguir.
Na vinha (o reino dos céus) vigora o amor, que é doação sem idéia de troca ou proporcionalidade, que constitui a regra entre nós: para uma tarefa de 20 dias o pagamento é "x", se o trabalho durar 40 dias, será de "2x", e assim por diante. Comparação, reciprocidade e murmuração são hábitos humanos que tendemos a levar – pois estão arraigados em nós – mas que devemos evitar quando convidados ao esforço de construção do bem.
Quanto ao denário, o pagamento comum a todos os trabalhadores, representa ele o conjunto de condições que naturalmente se associam ao trabalho no bem, ainda quando realizado por aprendizes como nós: paz, esperança, progresso espiritual e apoio para a superação de surpresas e dificuldades.
Ao estudar essa parábola, no cap. XXI de O Evangelho segundo o Espiritismo, o Codificador, diferentemente do que ocorreu em outros capítulos, preferiu não incluir comentários seus acerca do assunto, apresentando apenas quatro mensagens de orientadores espirituais, uma delas do Espírito de Verdade, todas afirmando que nós, os espíritas, somos os trabalhadores da última hora, não porque somente agora estejamos sendo chamados, mas por já termos recusado o convite em oportunidades anteriores, bem como devido às transformações previstas para o nosso orbe, que deverá passar de um mundo de provas e expiações para um mundo de regeneração, com a transferência para outras estâncias vibratórias daqueles que não apresentarem as características necessárias à permanência na Terra nessa nova situação.
Conquanto saibamos que essa transição não será brusca, operando-se no espaço de gerações e não de anos terrestres, trata-se de alerta grave, pois sabemos que mais se pedirá a quem mais recebeu e não há dúvida de que, como espíritas, recebemos muito em termos de conhecimento e orientação sobre a vida e nosso papel nela.
Estejamos certos de que, na presente reencarnação, nosso contato com o Espiritismo representa o convite para o "trabalho na vinha", isto é, a promoção do bem no mundo, a partir de nossa reforma pessoal.
Que possamos, desta vez, aceitar o convite generoso que nos chega por misericórdia de acréscimo de nosso Pai.
1) O denário era moeda romana, de prata, com efígie do imperador. Tinha o valor de uma dracma e era a importância que correspondia à diária de um trabalhador.
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